Saturday, February 21, 2009

 
"As palavras são coisas que rodam contra o tempo,
que se dobram e mergulham nas águas dum sono universal.
São pedras que se atiram contra as trevas.
O povo gosta disto.
É aqui que tu morres. Transformas-te cada vez mais nessa
grande e íngreme luz que se precipita pela areia fora e detém
as ondas.
Em abril pergunto:- onde estás?
Sei que a teu lado crescem eucaliptos e trepadeiras e que a tua
cor é o branco.
Por isso eu pergunto:- onde morres? Pois eu sei que estas pedras
são mortos muito antigos e procuro-te.
Em maio tu morres e em dezembro és um som branco e grandioso
que, apesar de tudo, não conheço.

Via-te descer as montanhas e não sabia que era a mim que
procuravas.
Via-te dominando o tempo e as coisas com uma expressão infinita,
quando nas colinas mais altas um fogo antigo se acendia.
Era, dir-se-ia, a hora do regresso dos ventos mortais e, na orla de
uma antiga e profunda claridade, à beira das fronteiras batidas
pela súbita invernia, aí, no recôndito de uma grande e universal
razão, se estendesse os olhos poderia ver os campos de oliveiras
e mais ao fundo a areia assinalando um oceano, ou um deserto.
Aí o passado e o futuro se bifurcam.
Via-te olhar a arquitectura dos promontórios.
Tu partias para todas as direcções em demanda da última e
inebriada razão.
Talvez procurasses a morte, ou o círculo onde confluem todos os
rios, todos os lugares, terras e perfumes. Onde o amor, a morte
e a vida, se bifurcam- esse lugar único e último, que depois da
morte nos rodeia."

Mário Rui N. Cordeiro, in CENTRAL PARK, livro inédito

Comments:
Lindíssimo texto, de um autor que desconhecia.

Um abraço amigo

P.S. - Já linkei para aqui o novo "Retalhos de Bem-Fica" :)
 
bonsoir!
sim, estes textos sao lindos, correm pela pàgina...
vai ver o blog:
" a dispersa palavra"...surpresa!
bjos
merci deste post.
LM
 
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