Monday, December 10, 2007

 
" DEVES ESQUECER

Retratos de mulher,
menos daquelas que amei profundamente.
Cartas de noivas dez anos dentro das gavetas,
a respiração difícil, papéis sem pulmão,
tudo deves esquecer, principalmente as faces.
O nome é impossível.
Lá fora, a vida.
Já não me lembrava dessas existências,
entre as quais a minha.
Nem um adjetivo!
Enfim sabes o que é solidão!"

(Rio de Janeiro, 1940)

In Aydano do Couto Ferraz, "Os poemas perdidos e
seu reencontro", 1983, Civilização Brasileira/Pró-Memória
Instituto Nacional do Livro

Comments:
Eu esquecerei tudo,
menos que adjectivo,
em português de Portugal,
se escreve com um "c" antes do "t".

Um abraço, amigo Zé!
 
Caro Manuel,

Este poema é de um brasileiro, logo a variante do português que aqui se utiliza é a do português do Brasil, conforme tu sabes!
Mas eu gosto de ler os autores brasileiros na sua própria variante e gostaria que eles nos lessem também a nós do mesmo modo!
Há por aí muito ruído à volta do Acordo Ortográfico e muito pouco siso. Não acho que esse seja o teu caso...
 
Santa Iria de Azóia, 13 de Dezembro de 2007 – Amo a língua portuguesa acima de muitas outras coisas, porque foi através dela que, pela primeira vez, nomeei os seres e as coisas que me são mais queridos. E com ela cresci e graças a ela sei quem sou. E nela aprendi a dizer não e sim com toda a veemência do mundo.
Porém, não tenho quaisquer angústias relativamente ao destino do português de Portugal e o mesmo sentimento tenho em relação a todas as suas variedades. Eu sei de ciência segura que esta língua que amo e sou não é eterna e que não há acordos, nem decretos, nem guerras, que possam travar qualquer uma das suas muitas variedades de fazer o seu próprio caminho.
Querer impor por decreto uma grafia - e porque não um léxico comum? -, é uma forma totalitária de pretender resolver um problema que, se o fosse verdadeiramente, jamais poderia ter uma solução.
Sei que daqui a mil anos, esta belíssima”flor do Lácio” (a expressão é de Olavo Bilac), será coisa bem diversa daquela em que hoje sinto e exprimo os meus sentimentos. O mesmo acontecerá com todas as variedades faladas na América, em África e na Oceânia. Bom seria que, daqui a mil anos, se pudesse dizer que esta ou aquela língua, que este e aquele crioulo, tiveram o português como língua mãe. Isso me basta e me consola. No presente, obviamente!
 
Caro Manuel,

Estamos de acordo quanto à língua portuguesa. Também ela é a matriz daquilo que eu sou hoje!
Mas não estamos de acordo quanto à grafia. Onde o drama?! Queres que te enumere as alterações de grafia ao longo dos tempos?!
De resto, o teu comentário vem a propósito de um poema de um autor brasileiro...O que eu digo é que temos obrigação de ler os nossos respectivos textos literários nas grafia de cada país. Só isso! O resto são resquícios de um império irremediavelmente afundado. Para bem de todos!
Nesta questão não te acompanho a ti...nem ao Vasco Graça Moura!
Abraço cordial!
 
Na grafia...e não nas grafia, claro!
 
Caro José,

Não podemos estar de acordo em tudo. E ainda bem que assim é. A diversidade é a nossa riqueza.
Enquanto puder ler e entender no português do Brasil, tanto melhor e provavelmente vou consegui-lo até ao fim dos meus dias.
O que virá depois, já não me preocupa muito.
Preocupa-me muito mais o que não se conseguiu em Bali.
Um abraço,
Manuel
 
Vamos por partes:
1.
não conhecia este vate. Gostei de o conhecer, porque gostei do que li.
2.
acordo ortográfico. Zé Ribeiro, tenho muita pena mas estou mais de acordo com o seu amigo Manuel da Mata.
Escrevi, aí, algures, sobre a matéria. E quando me dei conta de que alguém me pudesse dizer o mesmo que o ZR disse ao seu amigo ("não te acompanho a ti...nem ao Vasco Graça Moura!") arrepiei-me todo.
Aí voltei a postar sobre a matéria - a propósito das diferentes leituras que há entre mim e o dito VGM (e deixei expresso que não tenho pretensões a considerar-me tão culto como ele é. Mas quanto ao resto. Nikeles).
A minha opinião é, em suma, que cada um escreva conforme quiser e, quando muito, de acordo com as normas da respectiva Academia. Mas imporem-nos os brasileiros que nos exprimamos em "brasilês"... Não.
Eles são mais que nós? E depois? Não são mais os anglófonos estrangeiros que os ingleses? Não são os hispanófonos de todo o mundo muito mais que os espanhóis?

São os americanos (canadianos incluídos) que ditam como se escreve e fala em Inglaterra?
Serão os hispano-americanos a dizer como um espanhol se deve exprimir em castelhano?

Nah!

Tudo bem. Mas não me obriguem a “pegar o ônibus” nem a “vestir o fato, de fato não exato” ou “beber o chope ou o suco que não seja exatamente o nosso predileto” ou a “mandar na delegacia o cafageste pegado no banheiro”, nem a “aderir a qualquer ação ou reação”, nem a “termos de comprar na usina de Santo António”, nem a “a visitar o sítio do coronel em Minas”, nem a aceitar, simplesmente, que ele “falou” o que cada um pensava...
Porque havemos nós de “falar anistia” em vez de “dizer amnistia” ou a escrever “seqüestro” em lugar de sequestro? Porque teremos de chamar “Antônio” ao seu homónimo (homônimo, dizem eles) António?

Concordo (aí também com o ZR) que leiamos João Cabral de Melo Neto, ou Vinicius, ou Jorge Amado... E tantos outros, no seu português tropical. (E se eu gosto de os ler!). Mas eles (esses que nomeei e muitos mais) por certo não concordariam em que me obrigassem a escrever segundo a sua ortografia e as suas expressões...

[Desculpe o parêntesis: um dia, há muitos anos, quando numa papelaria, em Copacabana, disse a uma senhora que me atendeu, ao que ia... Ela vira-se para uma colega e diz (traduzo em linguagem fonética): “qu’engràcádo! Eli tem sôtàquê!”.
Claro que não me contive. E respondi-lhe: “curioso! Nós é que vos ensinámos a falar... E nós é que temos sotaque?!...Deve haver equívoco”

Repare, ZR, na base deste "convencimento" destas senhoras é que está o totalitarismo que os brasileiros nos querem impor. E pior! Só por razões comerciais!]

ZR, tenha paciência!

Há um pormenor que me leva a dar alguma razão ao ZR, relativamente ao seu amigo MM: parece que numa expressão dele se vislumbra (lá longe) um tique do VGM. Que é quando o seu amigo (e meu, de certeza, porque os seus amigos são meus amigos também) diz que só não perdoa que ele escreva adjectivo sem o “c”. (O VGM, na verdade, entre outras patetices diz que os brasileiros não sabem escrever...)
Não, eu aceito que ele (o brasileiro) escreva adjetivo, mas não suporto que ele me imponha escrever com a mesma grafia.

Ele é livre de escrever adjetivo... Mas não me violente a ter deixar de escrever adjectivo.

Fiz-me entender?

Grande abraço
jl

PS: desculpe a extensão do arrazoado.
jl
 
Santa Iria de Azóia, 15 de Dezembro de 2007 – O meu amigo José Ribeiro, que muito tem feito pela literatura e cultura portuguesas, quantas vezes de forma mais ou menos solitária e com prejuízo do seu património pessoal, defende com entusiasmo o já velho acordo ortográfico, que, em minha humílima opinião, é, desde sempre, um nado-morto.
Felizmente, a riqueza do português radica nas suas muitas variedades e também na pluralidade de opiniões e até paixões que vai suscitando. Sobretudo, quando os senhores do mando se lembram de que deverá ser ratificado e entrar em vigor, nem que seja só em 2017, isto é, vinte e oito anos após os sábios o terem dado como concluído! Creio que esta é uma daquelas bandeiras que se agitam, quando se pretende desviar a atenção do real quotidiano, que para a maioria do povo tão pesado é. E não tenho, nem nunca tive, tendências para elaborar teorias de conspiração.
Quanto a Vasco da Graça Moura, confesso que não é má companhia nestas matérias. Noutras, mormente as políticas, raramente encontro entre nós um ponto de contacto. Já escrevi até que o tradutor da Divina Comédia é o apologista de todos os cabos de serviço no PSD. Estultícia minha seria, todavia, não lhe reconhecer as muitas qualidades que possui enquanto artista e homem de cultura. Mas não é este o ponto, creio eu.
Para o bem e para o mal, Portugal construiu um formidável império na primeira metade do séc. XVI. Provavelmente, para proveito de poucos e desgraça de muitos, como é regra que as coisas aconteçam. A literatura, nomeadamente a literatura, muito ficou a dever à construção desse tal império. De Zurara a Manuel Alegre, passando rápido por nomes menos importantes como Vicente, Camões, Fernão Mendes Pinto e Vieira, muito os livros e a cultura portuguesa ficaram a dever à expansão marítima. Não me parece, assim, que haja no meu desejo de que crioulos ou novas línguas possam ter o português como estrato, uma defesa dos valores do colonialismo.
No tempo que me foi dado viver até ao presente, sempre pugnei pela independência dos povos e nessa senda continuarei, enquanto a força física e o juízo não me faltarem. Se o império acabou mal e tarde, eu não tenho culpa.

Um abraço, amigo Zé!
 
Grande discussao!
Também nao penso que hei-de escrever sem " c" antes do que quer que seja. Poça!
Tinha uma amiga brasileira que me dizia por vezse:
"Fala brasileiro prà mim, que portugûes nao entendo!"Agora jà sou mais francesa que portuguesa, serà?
desculpem o acento grave, nao tenho outro...prece que nao é mau reinventar a lingua, que tudo està em movimento, né?????
Mas essa lei...mi deixa bôba!
Aqui ainda se batem pour féminiser les mots comme " écrivaine" madame la ministre,poétesse...femmes des lettres ce n'est pas une recette de cuisine avec ds pâtes alphabétiques!!!Qui est de la partie?As Québéquoises sao mestras e pioneiras nessa reforma que me leva aqui a botar discurso...
bajos...
LM
 
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