Sunday, September 30, 2007

 
" A MÃO NO ARADO

Este nom he apocrifo mas cousa
muy verdadeira

I Cronica Breve de Santa Cruz
PMH-Scriptores, V.I


Feliz aquele que administra sabiamente
a tristeza e aprende a reparti-la pelos dias
Podem passar os meses e os anos nunca lhe faltará

Oh! como é triste envelhecer à porta
entretecer nas mãos um coração tardio
Oh! como é triste arriscar em humanos regressos
o equilíbrio azul das extremas manhãs do verão
ao longo do mar transbordante de nós
no demorado adeus da nossa condição
É triste no jardim a solidão do sol
vê-lo desde o rumor e as casas da cidade
até uma vaga promessa de rio
e a pequenina vida que se concede às unhas
Mais triste é termos de nascer e morrer
e haver árvores ao fim da rua

É triste ir pela vida como quem regressa
e entrar humildemente por engano pela morte dentro
É triste no outono concluir
que era o verão a única estação
Passou o solidário vento e não o conhecemos
e não soubemos ir até ao fundo da verdura
como rios que sabem onde encontrar o mar
e com que pontes com que ruas com que gentes com que montes conviver
através de palavras de uma água para sempre dita
Mas o mais triste é recordar os gestos de amanhã
Triste é comprar castanhas depois da tourada
entre o fumo e o domingo na tarde de novembro
e ter como futuro o asfalto e muita gente
e atrás a vida sem nenhuma infância
revendo tudo isto algum tempo depois
A tarde morre pelos dias fora
É muito triste andar por entre Deus ausente

Mas, ó poeta, administra a tristeza sabiamente "

Ruy Belo, O PROBLEMA DA HABITAÇÃO, 1962

Comments:
Administrar a tristeza sabiamente ... é reencontrares a vida de rompante, num repente, num qualquer principio de Outono, perto do mar.


Saudades Zé.
Belo o poema que nos trazes, sem surpresas, sem "ruídos", apenas belo e verdadeiro.
 
Fui surpreendido pela morte de Ruy Belo, em Castelo Branco, num Verão do início dos anos oitenta.
Belo e o Eugénio são os únicos poetas encarneirados das minhas estantes.
De Belo tomei para epígrafe de um poema meu " Teu nome cidade é Jerusalém".
Um abraço Zé. Extensivo à comunidade, que eu próprio também integro.
 
( ...) nesta manha de outono aluvioes da vida murmuram-nos mulheres minuciosas
O ombro da colina ergue o nevoeiro
na madrugada nao cantaram melros
A areia bebe cheia a chuva enquanto nos infinitamente nos distanciàmos
de quanto- diz a santa- desejàmos
Aonde està a mae da minha infância?
(" Sùplica", Ruy Belo,obra poética vol. 2).
Lindo o poema que escolheste neste principio de outono, admnistrar a tristeza...sùblime!
Zé, mas sao todos lindos.
Ouço pouco falar desta obra imensa.
" é muito triste andar por entre
Deus ausente", como sempre esta frase "deus ausente" me projecta e imediato em 1981, Polonia, a minha caminhada num campo de concentraçao.Aquele silêncio nao era possivel de ser contido.
Cà esperamos mais poemas do Belo
que tu conheceste. Um bom dia a todos, arrisquemos os humanos regressos, como ele diz...
beijinhosLM
 
Quanto mais releio Ruy Belo, mais humano me sinto.
 
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