Friday, January 12, 2007

 
Foi em certa curva do bosque que o vinho toldara completamente
a visão do mundo do Engº. Ferreira de Magalhães.
Dera-lhe para longuíssimas deambulações literárias. Paciência,
leitor. Um sorriso apenas, dizia, é o limite moral do nosso
esforço e é inútil o disfarce. Nem vale a pena tentar, bem vi
quanto é necessário para dissipar o medo. A tua moral, meu
velho, sei bem o que significa. É a moral de todos: que se
fodam os problemas alheios. Não tentes convencer-me da tua
inocência. Outros já o fizeram sem resultado. Mas tu...
Descobriste a urgência do tempo, ou será porque todos
morremos sempre cedo? Dizias isto em criança com uma grande
tranquilidade, pois a distância era ainda um enorme espaço lá
mais para o fim. Mas agora? Onde está a tendência para o
humor? Estás sério, grave, como um homem que já não
acredita em nada do que se diz e que desejaria esquecer a ponto
de já não se lembrar que tinha esquecido.
"Põe um anúncio", é a solução. Escreve assim: "Engº. Ferreira
de Magalhães, perdido no bosque, filósofo desempregado,
perora sobre a enorme chateza da existência humana, está
lúcido como um bêbado qualquer, não obriga ninguém a
escutá-lo, quem avisa é amigo".
E pronto, "aviso é aviso, anúncio é anúncio". Iremos recuperar
lentamente a nossa identidade. Muito lentamente. Deita
fora a pressa, isso foi antes e através do mau olhado. Vá,
gaita, não precisas de ser simpático comigo. É a simpatia
que te perde. Ninguém morre por isso. Deixa-te de merdas,
medricas é o que és. Cagarolas! Enfia as pantufas e o roupão,
aspira o perfume da televisão e toca hinos de louvor à
felicidade. Mas não te queixes. Fazes o que bem te der na
real gana mas lixas-te sozinho, não levas ninguém contigo.
Vais recuperar certamente, nada te choca a não ser essa
enorme distracção entalando-te o rabo à esquina do medo.
Não temas nada, alguém te disse tudo isto muito ternamente
ao longo dos caminhos da floresta. Acordaste bem disposto?
Nem deste conta da enorme carga de insónias a corroerem-me
as entranhas durante a noite. Dormes mal, a culpa é dos
tempos. O conselho de um Engenheiro só pode ser este: não
erres os cálculos. O tinto é um grande amigo. Bebe até que o
pipo fique contente. Outra do nosso ilustre companheiro com
certa sabedoria é a certeza de que nunca se pode salvar
apenas uma parte da floresta quando o incêndio já atingiu
desusadas proporções, é como as vagas do mar em noite
de procela, ai que ele fala tão bem como o Moraes! Mas não
há-de ser nada, as ondas estão calmas e o mercurocromo
não resolve as dores, do que a agricultura necessita é de
sapos vivos e água, muita água, até por causa das barragens,
ai preocupado que eu estou com o consumo exagerado
que por aí vai aquecer tão sóbrios cuzinhos de fofinhas
damas. A tua veia, sem graça nenhuma. Mas não te pedi
opinião nenhuma, fica sabendo. Sei bem desenrascar-me
sozinho, agora vou contar as estrelas no céu, grande ponto
me saiste. Sem jeito nenhum para nada, a não ser. A não ser
nada. Nada. Ninguém ajuda ninguém. Nietztche tinha razão,
achas? Nem sequer sei se tinha, talvez tivesse, mas isso
era quando tu lias livros sérios, agora só lês porcarias.

Comments:
Pois bebamos todos até que os pipos fiquem contentes.
Um abraço,MB
 
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